Teoria das Formas de Governo

AO UTILIZAREM  A RESENHA FAVOR COMENTAR

 

BOBBIO Norberto. Teoria das Formas de Governo. 9º ed. Editora Universidade de Brasília. 1997. Brasília.

RESENHA – Análise

Resenhado por:

Jackson Carneiro Viana, estudante de Economia UFPI

Norberto Bobbio, ao se referir às tipologias das formas de governo, afirma que tais tipologias apresentam dois aspectos: o prescritivo (axiológico) e o descritivo (sistemático). Ao analisar as formas de governo com caráter descritivo é permitido apenas analisar as formas de governo centrado nas suas características e estruturas que lhes são inerentes, contudo a maiorias das analises possuem um caráter prescritivo na medida em que além de descrever as peculiaridades de cada forma de governo, também são feitos juízos de valor sobre os mesmos. Da mesma maneira Norberto Bobbio propõe uma outra nomenclatura: uma sistemática e outra axiológica, que assumem respectivamente caráter descritivo e prescritivo. O autor afirma que o caráter prescritivo é quase sempre ideológico, pois é vinculado à realidade histórico-social e a juízos de valor. Ao mesmo tempo, o caráter axiológico toma as tipologias de governo em escala hierarquizada de forma que existem certas formas de governo que são melhores, boas, más, piores.

Bobbio diz que não se pode esquecer o uso histórico, além do sistemático e axiológico, que as formas de governo assumem para alguns autores. Estes autores percebem as tipologias das formas de governo como uma sucessão política de eventos que se desenvolvem no processo histórico e resultam numa forma particular de organizar a estrutura política. Uma espécie de desenvolvimento interno da própria história. Assim, “quando aquilo que é axiologicamente negativo se transforma em algo historicamente necessário o julgamento dos fatos predomina sobre o julgamento de valor”.

No capítulo I intitulado de “Uma discussão celebre”, Norberto Bobbio acrescenta que o pensamento político na Grécia já havia atingido uma grande sistematização até mesmo antes de Platão ou Aristóteles. Sua afirmação baseia-se no Livro “história” de Heródoto onde cita uma passagem no qual três personagens discutem sobre qual a melhor forma de governo: democracia, aristocracia, monarquia. O trecho é importante porque mostra a organização do pensamento político grego. Mais que isso, mostra que os defensores de cada uma das três formas de governo citado fazem juízos de valor acerca da outras formas de governo (caráter axiológico). A classificação sêxtupla das formas de governo, de acordo com Bobbio, é derivada de duas perguntas: Quem governa? E Como Governa? Daí resultam para a primeira pergunta: monarquia (um – bom); aristocracia (dois – bom); democracia (vários – bom); tirania (um – mal); oligarquia (poucos – mal); oclocracia (vários – mal).

O capítulo II que trata de Platão analisa principalmente a obra “A República” no qual é feita uma descrição da República Ideal, mas trata-se de um estado que nunca existiu e nunca existirá. Para Platão todos Estados que existem, na sua forma real, são corrompidos. Na República de Platão a forma ideal é uma só, mas ao contrário, suas formas corrompidas assumem variedades. “A forma da virtude é uma só, mas o vício tem uma variedade infinita”. Da mesma maneira Platão assume o caráter axiológico, pois faz juízos de valor a despeito das formas de governo existentes nas suas formas reais. Ao mesmo tempo, cria uma hierarquia da menos ruim para a mais ruim. A visão de Platão acerca da realidade dos governos é pessimista na medida que se situa entre o passado e o futuro, ou seja, o passado como forma de governo que um dia foi o melhor e o futuro como possibilidade distante. Neste aspecto Platão toma a timocracia (forma de governo situada entre a aristocracia e a oligarquia, assumida por Esparta) como a que mais se aproxima da forma Ideal, e atribuía sua falha e fator de corrupção pó honrar mais os guerreiros que os sábios.

Platão analisou os prováveis motivos que levavam à corrupção das formas de governo reais, os principais motivos são morais, ou melhor, amorais. O homem timocrático valoriza a ambição, honrarias, combate, belicosidade. O homem oligárquico valorizava a riqueza. O homem democrático valorizava a liberdade. O homem tirânico valorizava a violência, o poder. Enfim as qualidades amorais dominantes é que levavam à ruína cada umas das formas de governo de forma sucessiva: timocracia, oligarquia, democracia, tirania. “A corrupção de um princípio consiste no seu excesso”. Um tema recorrente, como nos fala Bobbio, é a discórdia que leva a ruína os governos. Isso se dá porque “o tema fundamental não é a ‘liberdade’ do individuo com respeito ao Estado, mas o da ‘unidade’ do Estado com relação ao indivíduo”, motivo pelo qual a discórdia é o elemento de desagregação da unidade do Estado. Bobbio afirma que há duas modalidades de discórdia: uma que ocorre dentro da própria classe dirigente (timocracia e oligarquia) e a outra da disputa entre governantes e governados (democracia e tirania). Platão toma as formas de governo de forma orgânica à semelhança do corpo humano. Quanto a isso, afirma que o Estado possui uma alma racional (ideal), passional (timocracia), passional (oligarquia, democracia, tirania).

Em “O Político” de Platão, a democracia também se apresenta como uma forma boa e má ao mesmo tempo, ou seja, a democracia é a pior das formas boas como também a melhor das formas más. A conseqüência deste fato é que as outras formas possuem um correspondente negativo o que não ocorre com a democracia para Platão. Mas por falta de terminologia a democracia é, ao mesmo tempo, boa ou má, ela apresenta-se positivamente ou negativamente. Em suma, para Platão as formas boas de governo são aquelas baseadas no consentimento ou na vontade dos cidadãos (legalidade).

No capítulo seguinte, que trata da sistematização clássica da teoria das formas de governo, Aristóteles desenvolve seis tipologias das formas de governo. (reino, aristocracia, politia, democracia, oligarquia, tirania). No caso de Aristóteles, o que define se uma “constituição” é boa ou má é seu comprometimento com “bem comum”, objetivo pelo qual os homens reúnem-se numa comunidade (Estado). “Quando os governantes se aproveitam do poder que receberam ou conquistaram para perseguir interesses particulares, a comunidade política se realiza menos bem, assumindo uma forma política corrompida, ou degenerada, com relação à forma pura”.

Também Aristóteles faz uso axiológico em sua classificação estabelecendo uma hierarquização das formas de governo e, ao mesmo tempo, juízos de valor sobre os mesmos. Pela ordem hierárquica, os pontos extremos (monarquia e tirania) são os que revelam o maior afastamento do compromisso com o “bem comum”. Mas quando nos referimos à politia e à democracia, a linha que separa uma tipologia da outra é muito tênue na qual a linha de demarcação não é clara.

Contudo, Aristóteles não se limita apenas as tipologias “puras”. Aristóteles afirma que cada tipologia apresenta-se em “varias espécies”. Para exemplificar cita a monarquia que tem por base aquela dos tempos heróicos (hereditária baseada no consentimento dos súditos), a de Esparta (militar), os “tiranos eletivos” (povos bárbaros). Chamada monarquia despótica baseia-se na violência, porém legitimada pelo consentimento dos súditos. Assim, o poder é exercido de forma tirânica legitimado e aceito pelos súditos. Tais características afastam qualquer confusão entre monarquia e tirania. O poder despótico é absoluto pela relação de servidão a que são submetidos os súditos. “Aristóteles justifica que há homens escravos por natureza. Da mesma forma, há também povos naturalmente escravos”. Sobre tais povos só pode-se exercer o poder despótico, pela relação de servidão e aceitação de sua condição, ou seja, é legítimo.

Outro trecho que Aristóteles cita, é importante para o estudo das tipologias das formas de governo porque afirma que a Politia é resultado de outras duas formas de governo: oligarquia e democracia. Daí a dúvida! Como de duas formas más pode surgir uma boa? O caráter que difere os tipos de governo para Aristóteles não é quantitativo, e sim, a qualitativo: rico e pobre. Por isso, a fusão de duas formas de governo más pode resultar numa boa, porque a união entre ricos (oligarquia) com pobres (democracia) resulta em algo que é positivo de uma forma mais abrangente, visando o “bem comum”. Para estabelecer os critérios de fusão das formas de governo, Bobbio constrói um termo: “engenharia política” de Aristóteles: consiste em conciliar procedimentos que seriam incompatíveis, adotar um meio-termo de posições extremas, reconhecer o melhor dos dois sistemas legislativos. “O principio que inspira esse regime de fusão é o da mediação – ideal da teoria aristotélica, fundamento, como se sabe, no valor eminentemente positivo que está no meio, situado entre dois extremos”. Dessa forma, Aristóteles reconhece em politia que a mediação entre duas formas de governo ruins que conciliem interesses mútuos podem visar o bem comum.

No capítulo IV que trata das formas de governo na visão de Políbio, um historiador grego.Políbio expõe as seis tipologias básicas das formas de governo – três boas e três más, e ainda cita uma sétima que seria uma síntese das três formas boas. Ao mesmo tempo, remete à idéia cíclica das formas de governo.Sua maior contribuição é a sistematização da teoria de um governo misto, que Aristóteles apenas esboça em “politia”. Políbio expõe uma filosofia histórica predeterminada segundo uma ordem natural estabelecida pela natureza na qual as formas de governo têm seu curso preestabelecido.

Mas cabem algumas observações em sua teoria, como o faz Norberto Bobbio. Ao contrário de Aristóteles que via em “politia” (forma boa) e democracia (forma má), Políbio vê democracia como uma tipologia boa de governo que corresponde a uma forma má, chamada de oclocracia. O critério de Políbio para diferenciar as formas boas das más não coincide com Aristóteles, ou seja, em função do bem comum. Para Políbio a distinção é percebida entre dois extremos: contraposição entre força e consenso e contraposição entre ilegalidade (arbitrariedade) e legalidade. Enfim, Políbio estabelece seis tipologias básicas: monarquia, tirania, aristocracia, oligarquia, oclocracia e democracia. Contudo difere de Platão que possuía uma visão degenerativa das formas de governo, partindo das formas boas às piores. Mas para Políbio tal sucessão se processa em ciclos degradativos fragmentados, ou seja, há alternância entre momentos bons e maus, que pela idéia cíclica voltam a se repetir. Pode-se também mencionar futuramente o esboço de uma visão moderna, que percebe as formas de governo como uma evolução das manifestações humanas (Platônica – degenerativa; Políbio – degenerativa fragmentada; Hegeliana ou moderna – progresso).

Uma observação importante feita por Norberto Bobbio é a condição fatalista das formas de governo no qual a ordem natural é a corrupção das mesmas num processo sucessivo e degradativo, seja continuo – para Platão – ou fragmentado – para Políbio. Para ambos tal condição corrompida das constituições é um processo natural: “o germe da corrupção esta no interior de todas as constituições”. Mas a tese primeira de Políbio é sua concepção da forma de governo misto. Sobre de tal teoria deduz-se ser a única forma positiva, pois se torna uma tipologia “estável”, diferentemente das outras que estão fadadas ao fracasso, à corrupção, ao vicio. Mas a estabilidade do governo misto não é atemporal, seu esfacelamento é inevitável a exemplo da constituição romana.

Políbio fala que as formas de governo simples são más porque são simples, diferentemente da forma mista, pois ela reúne no governo as três formas boas. “A composição das três formas de governo consiste no fato de que o rei está sujeito ao controle do povo, que participa adequadamente do governo; este, por sua vez, é controlado pelo Estado. Como o rei representa o princípio monárquico, o povo o princípio democrático e o senado a aristocracia, o resultado dessa combinação é uma nova forma de governo…”. É pela presença dos três tipos de poderes que se minimiza a instabilidade, mas não a extingue.

Políbio afirma que a primeira causa do fracasso ou sucesso de um povo está na sua constituição, mas hoje, como afirma Bobbio, esta tese não corresponde à realidade. Pois não simplesmente o aspecto político define a situação de um povo, como também sua condição social. Sua contribuição na teoria do governo misto é muito importante porque analisa a situação política em função de sua estabilidade, caso da constituição romana a que lhe inspirou a análise.

No Capítulo V trata do Intervalo enorme entre a teoria clássica e moderna de governo, no qual se situa a Idade Média. As teorias das formas de governo em tal período perderam seu valor quase absoluto. Por isso, Norberto Bobbio<!–[if !supportFootnotes]–>[1]<!–[endif]–> propõe as razões que levaram à depreciação de tais teorias. Tal desprezo se dá porque o Estado é visto como algo que controla a natureza má do homem, o homem do pecado. Assim, o Estado tem função exclusivamente de controlar os homens com a espada da justiça. Porque quem salva não é o Estado, mas sim a Igreja. Por isso, numa atmosfera onde as constituições só podem ser más, não pode conceber uma teorização de tipologias de governo. O grande problema medieval é a dicotomia Estado-Igreja e não suas formas. As concepções, na idade média, sobre governo são negativas, não por sua condição negativa em si, mas porque sua situação é inferior a outra que é positiva, ou seja, a Igreja.

O capítulo VI que trata da contribuição de Maquiavel à teoria política. Maquiavel substitui de início a tripartição clássica (Platão, Aristóteles, Políbio) por uma bipartição, afirmando que “todos os estados<!–[if !supportFootnotes]–>[2]<!–[endif]–> que existem ou já existiram são e foram sempre foram repúblicas ou monarquias”. Tal bipartição se baseia numa diferença essencial no qual o poder reside na vontade de um só (principado) ou na vontade de muitos (república aristocrática – vontade de um colegiado restrito; república democrática – vontade baseada em assembléia popular). Portanto o que se modifica da passagem do principado para a republica é simplesmente a natureza da vontade, manifestada de forma única ou coletiva (restrita ou popular). A distinção de Maquiavel é baseada numa experiência mais ampla que a dos gregos que imaginavam “republicas e principados que nunca foram vistas ou conhecidas como realidade”. Para Maquiavel, o essencial para um Estado bem ordenado é sua vinculação ao principado ou à democracia, de modo que qualquer estado intermediário entre ambas está destinado a desaparecer, por apresenta-se de forma instável. Tese que parece contradizer o que Políbio afirmou como caráter positivo: a estabilidade através de um governo misto. Mas não se pode confundir formas intermediárias com o Estado misto de Políbio. Quanto a isto, Norberto Bobbio afirma que nem todas as combinações entre formas intermediárias resultam em algo positivo para o estado por isso ele diz que “o Estado Intermediário deriva não de uma fusão de ambas as partes, num todo que as partes transcende, mas da conciliação provisória entre duas partes que conflitam, que não chegaram a encontrar uma constituição unitária que as abranja, superando-as a ambas”.

Quanto à classificação dos principados Maquiavel os distingue de duas maneiras: em principados hereditários e principados novos. Nos primeiros o poder é transmitido com base na sucessão. No segundo o poder é conquistado. Quanto aos príncipes herdeiros há duas espécies: há príncipes que governam sem intermediários e aqueles que governam com intermediários. Nos primeiros o poder é absoluto porque governa com a ajuda de ministros a quem lhe são servis. No segundo o poder, de certa forma limitado, por que o príncipe governa com ajuda da nobreza que possui uma posição preeminente cuja função não pode ser desconsiderada pelo príncipe. O primeiro príncipe de que se fala é bastante comum às monarquias despóticas ou despotismo oriental, também citado por Aristóteles.

Maquiavel estabelece uma maneira nova de classificar baseada na forma como o poder é conquistado: 1) pela virtu (coragem, valor, capacidade, eficácia política); 2) pela “fortuna” (sorte, acaso, influência das circunstâncias); 3) pela violência; 4) pelo consentimento dos cidadãos.

Os principados conquistados pela virtude são mais duradouros devido à capacidade pessoal de dominar os eventos, de alcançar um fim objetivado por qualquer meio. Já os principados conquistados pela fortuna são os que o príncipe conquista devido a circunstâncias favoráveis, e não pelo próprio mérito, são menos estáveis. Maquiavel afirma que não é apenas um desses fatores isolados que garante a conquista do poder, é preciso a união de ambos fatores.

Quanto ao poder conquistado por meio da violência (per scelera) caracteriza-se como o tirano tradicional. Mas fique claro que Maquiavel não faz distinção entre governos bons ou maus, entre príncipe e tirano, visto que o fim de ambos é a manutenção do poder. Assim percebe-se que todos os príncipes novos são tiranos, seja pela virtu, seja pela fortuna, ou violência. Para Maquiavel o critério que distingue a boa da má política é o êxito em sua conquista e manutenção. Então o governo é sempre bom, independente da maneira como é alcançado, desde que consiga mantê-lo. A discussão remete a celebre frase: os fins justificam os meios. O julgamento do príncipe em bom ou em mau não pode ser feito, para Maquiavel, com base na forma como emprega a força ou a violência, e sim, nos resultados que alcança com tal uso.

Quando Maquiavel analisa as teorias básicas das formas de governo em sua tripartição, muito se assemelha com Políbio, principalmente no se refere à teoria dos ciclos. Para ambos a sucessão das formas de governo é regida por uma lei Natural preestabelecida, mas Maquiavel é mais realista, e não acredita que uma forma de governo ao findar seu ciclo o dê inicio novamente. Sua concepção prevê que este Estado fadado ao fracasso não terá forças para sair de uma forma de governo arruinada e chegar a uma forma melhor, e superior, tal Estado esta destinado a ser engolido por um Estado mais bem organizado, e mais forte. As formas de governo em Maquiavel assumem uma força “maligna” na medida em que todas elas, tanto as essencialmente más quanto às boas, trazem em si o principio de sua degeneração e maldade.

Quanto à situação romana, Maquiavel diz que a constituição romana alcançou sua perfeição e equilíbrio por força das contradições e disputas inerentes à sua realidade. Isso quer dizer que a gestação da constituição romana e a transferência de poderes, o controle mútuo, as contradições internas tiveram como resultado a união positiva das três formas básicas de governo (monarquia, aristocracia, democracia – citada também por Políbio), garantindo a estabilidade romana. A novidade é que para Maquiavel o processo histórico é constituído de contradições que resultam, quando resultam, em algo positivo equivalem a um ponto positivo para a sociedade como um todo. Assim, afirma que dos pontos antagônicos (patrícios e plebeus) nasceu uma condição benéfica. Norberto Bobbio assim fala, “o governo misto deixa de ser um mero mecanismo institucional para tornar-se o reflexo (superestrutura) de uma sociedade determinada: é a solução política de um problema – o conflitos entre interesses antagônicos – que surge na sociedade civil”.

No capítulo seguinte destinado a Jean Bodin cuja teoria do pensamento político conferiu-lhe o título de teórico da soberania, será discutido o poder supremo e absoluto do rei – o poder soberano. “Por soberania entende-se o poder absoluto e perpétuo que é próprio do Estado”. Os atributos da soberania expostos por Bodin são dois: o caráter absoluto e a perpetuidade. O caráter absoluto diz respeito à não observância das leis positivas promulgadas pelos seus predecessores. Contudo poder absoluto não quer dizer poder ilimitado, posto quer há um poder, que de acordo com Bodin, é superior ao poder do soberano, e não é derivado de sua vontade ao contrário das leis que promulga e submete a seus súditos. Este poder sãos as leis naturais ou divinas e as leis que fundamentam o Estado Outro poder, que para Bodin, é superior ao poder do soberano trata das leis que regulam as relações privadas entre os súditos, como a propriedade privada. Dessa forma, Bodin analisa a sociedade num duplo aspecto, público e privado, no qual a esfera privada tende a escapar da regulação do Estado (suserano). Bodin confirma somente a tripartição clássica das formas de governo, mas nega a distinção entre formas boas e más, por que vê tal distinção como sem nenhum fundamento como também a teoria do governo misto, como cita Norberto Bobbio. Bodin afirma que se fosse classificar a forma de governo em função dos defeitos e qualidades que apresentam, tal classificação seria infinita. Já no que se refere ao governo misto Bodin diz: “Os poderes reais, aristocráticos e populares, em conjunto, só têm um resultado: a democracia”.

Bodin não aceita a teoria do governo misto porque sua teoria do poder soberano não admite a divisibilidade do poder. Quando o Estado está divido, perde a unidade e a estabilidade. Ou o poder é total e indivisível ou não constitui realmente um Estado. A principal característica do governo misto é que supõe a divisibilidade dos poderes entre grupos de interesses diferentes, mas isto não é tratado por Bodin como um fator positivo, pois a unidade do Estado é resultado de um poder soberano capaz de lhe fornecer estabilidade.

Norberto Bobbio afirma que Bodin toma a existência de Estados compostos retomando a análise dos Estados históricos nas relações entre soberania e exercício, de forma que o governo pode ser monárquico-aristocrático ou monárquico-democrático, sem, contudo, ser misto. Isso ocorre porque o poder pode residir nas mãos de um monarca, mas seu exercício pode ser delegado a uma assembléia aristocrática ou popular. Isso não torna o poder divisível, na medida que permanece no soberano. Esta distinção entre formas de Estado e formas de governo aumenta a possibilidade de combinações entre ambos resultando em seis ou até nove combinações diferentes, escondendo a idéia da tripartição clássica.

A distinção entre Estado e governo assume em Rousseau uma característica semelhante, mas para Rousseau a soberania concentra-se no povo, podendo ser governada sob três modalidades, no qual o poder executivo pode ser atribuído a uma só pessoa, poucas, ou muitas. Enquanto para Bodin a soberania pode residir tanto no povo, no príncipe, na aristocracia – mas manifesta uma preferência pessoal pela monarquia. A lógica é a mesma para ambos porque tratam da soberania como indivisível.Contudo Rousseau aceita a teoria do governo misto por entende-lo não ao nível do Estado e sim ao nível do governo, aceitando tal concepção de forma tão natural que afirma não haver Estado que não seja misto. O Estado misto não representa um equilíbrio entre poderes igualmente soberanos, razão pela qual bodin não aceita tal idéia. Principalmente porque Bodin percebe, não a coexistência, mas a predominância de um deles, que manifesta o verdadeiro poder soberano, e poderes subordinados que constituem não o regime (Estado), mas o governo.

A distinção entre regime e governo, entre titulo e exercício tem outras conseqüências já que Bodin não aceita a teoria do governo misto nem distinção entre formas boas e más, porque a corrupção não afeta o Estado, e sim, o governo. Assim, ele diz que cada uma dos regimes (aristocrático, monárquico e democrático) pode assumir a forma real, despótica, e tirânica. Não se trata de regimes diferentes, mas de formas de exercícios distintos. No caso da Monarquia, o governo real é aquele que o monarca respeita as leis da natureza, o tirano, não as respeita. Na despótica, permanece a idéia aristotélica cujo despotismo justifica-se pela relação senhor-escravo. Mas justificação é diferente da proposta por Aristóteles que percebia uma condição natural de entre homens livres e escravos. Para bodin, a relação baseia-se no “direito das armas e da guerra justa”. Ou seja, é conseqüência da vitória numa guerra justa, justa porque repara um mal cometido pelo inimigo, impondo-lhe um castigo, sua escravidão. Para Bodin a monarquia despótica é considerada superior à tirânica, porque a primeira é severa no exercício do poder, mas com justificativa. A segunda, além de severa ilegítima.

No capítulo VIII será discutido o pensamento político de Thomas Hobbes, obra Leviatã. Hobbes segue a mesma linha de pensamento de Bodin: não aceita a distinção entre formas boas e más, como também a teoria do governo misto. Para Hobbes o poder soberano também é absoluto, mas tal adjetivo é elevado ao seu extremo. Bodin afirmou que embora o poder do soberano seja absoluto admite certos limites como as leis naturais ou divinas, e os direitos privados. Para Hobbes esses limites não se fundamentam, para justificar sua afirmação ele diz, nas palavras de Norberto Bobbio, “o vinculo que os súditos têm em relação às leis positivas não é da mesma natureza que prende o soberano às leis naturais”. Esta afirmação sugere que os súditos vinculam-se ao soberano por leis positivas, pela força do poder do soberano. Mas as leis naturais não imprimem penalidades ao soberano caso não as observe. Dessa forma, o soberano é juiz da conduta de seus súditos, mas a sua conduta só pode ser julgada por ele próprio, assim as leis naturais não têm efeito, podendo ser contrariadas. Outro ponto exposto por Bodin é a superioridade do direto privado sobre o soberano. Para Hobbes, a não-interferência do soberano nos assuntos privados não é resultado de sua superioridade em relação ao soberano, mas por que tal direito tem sua fonte na vontade dos indivíduos enquanto membros da sociedade em suas relações econômicas, visto que o soberano deve preservar tais relações. Dessa forma, a esfera privada (ligada ao estado de natureza), para Hobbes dissolve-se na esfera pública após a criação do Estado. Norberto Bobbio coloca tal questão da seguinte maneira: “Só o Estado pode garantir, com sua força, superior à força conjunta de todos os indivíduos, que o que meu me pertença exclusivamente assegurando assim o sistema de propriedade individual”.

Quanto ao caráter absoluto, é dele que deriva a rejeição da distinção entre formas boas e más, porque o poder do soberano sendo absoluto, não pode ser atingido pelas leis que ele mesmo prescreve. Assim não é possível distinguir um governo em bom ou mal por não respeitar as leis, de forma que sendo o soberano quem as cria, não há nenhuma medida que possa julgar aquele que as respeita ou não. Bobbio completa, “quando o poder não tem limites, o próprio conceito de abuso se torna contraditório”. Assim, não há critério lógico que distinga o rei do tirano, a não ser por meio de juízos de valor. Se o poder é supremo não pode haver nada que diferencie o tirano do rei, no que se refere á amplitude do poder. Assim, não se sustenta a afirmação clássica de que rei tem poder limitado, e o tirano não, pois se o rei tem poder limitado, naturalmente não é rei. Se o poder não tem limites não há razão para falar em excessos. Hobbes ainda afirma que aquele que conquista o poder de forma legítima torna-se um rei legítimo, desde que reconhecido pelos cidadãos, caso contrário, permanece inimigo e nem chega a tornar-se tirano.

Exposta a diferença entre tirania e reino, Hobbes analisa a situação da monarquia despótica. Sua distinção não difere das anteriores. Para Hobbes o poder do príncipe que tem a mesma natureza do poder do senhor sobre seus escravos, é conhecido como despótico. Mas há algo a acrescentar, pois no texto de Hobbes o conceito de despotismo aparece desligado da idéia de guerra justa, e figura simplesmente como guerra. Isto porque Hobbes não aceita a distinção de guerra justa visto que a fundamentação da guerra justa é baseada unicamente na vitória. Enquanto perdurar a guerra, para ambos os lados, ela é justa, mas no momento da vitória passa a ser justa apenas ao vencedor. Com as palavras de Bobbio: “Por isso Hobbes tinha razão em falar unicamente em vitória e guerra. Se estoura uma guerra entre dois antagonistas que não admitem nenhum juiz superior, a vitória é o único critério para determinar quem tem razão”. O que garante a legitimação do poder despótico é a consentimento de quem se submete, por razões de manutenção de vida.

Outra caracteriza em Hobbes é a rejeição da teoria do governo misto. Para Hobbes a divisão do poder ocasiona a destruição do Estado. Se o poder se encontra dividido não é soberano, mas se continua soberano, não está divido, ou seja, a divisão pode ocorrer somente em aparência. Norberto Bobbio diz que a critica de Hobbes da teoria do governo misto origina outro problema, a possível confusão entre governo misto e teoria da separação dos poderes. A idéia do Estado misto não é fundamentada na divisão do poder, e sim na composição do Estado pelas classes que o constituem. Assim, admitindo as funções do Estado sendo legislativa, executiva e judiciária, a identificação da divisão do poder tendo em vista o governo misto só poderia ser feita se cada classe fosse incumbida de uma função do Estado. Mas o perfeito governo misto é aquele que reúne todas as classes na função legislativa, pela idéia de indivisibilidade do poder.

Trabalhado de forma breve, Bobbio faz menção a John Locke (Dois Tratados Sobre o Governo Civil), numa teoria do sistema político baseado na figura de duas partes do poder, parlamento e rei, de duas funções do Estado, executiva e legislativa. O poder legislativo emana do povo representado pelo parlamento; o pode executivo é delegado ao rei pelo parlamento.

O capítulo IX trata de Giambatista Vico. A teoria de Vico emprega a tripartição tradicional das formas de governo para traçar as linhas do desenvolvimento histórico, partindo da barbárie à civilização. A novidade inerente à obra de Vico é sua análise dos tempos obscuros, que antecedem a história escrita e narrada. A tese de Vico é a de que o estado primitivo do homem foi o “estado bestial”, no qual os homens são conduzidos como animais, ausência de relações sociais, completa inexistência de vida comum ou familiar (associal). Vico também faz uma distinção com base em três tipos de autoridade: monástica, econômica, civil. Para Hobbes, o estado da natureza é aquele que o homem vive por sua conta, e precisa cuidar de sua própria defesa, pois vive numa guerra de todos contra todos, mas esta fase decorre da falta de autoridade ou de um poder comum que impeça a manifestação dos instintos humanos. Em Rousseau, o estado natural é identificado como o “bom selvagem”, figura que leva uma vida simples com o contato com a natureza, ao contrário de Vico que o toma em sentido negativo. Para Vico o estado bestial corresponde à fase monástica, onde se encontra a verdadeira origem da história da humanidade. A humanidade não passou diretamente do estado bestial para o das repúblicas, entre ela há a fase das famílias, em que se forma a primeira etapa da vida social, incluindo tanto os filhos, descendentes e servos submetidos à autoridade do pai. A este estado corresponde a autoridade econômica. Uma fase intermediária entre a fase bestial e a civil é a inovação de Vico, recorrendo a complexidade da história para expor sua variedade. “Graças a um longo período de ciclópica disciplina familiar”, a união dos chefes de família representa a primeira forma de Estado, que corresponde à república aristocrática, enquanto união dos chefes de família. Assim, depois da autoridade monástica e econômica, a primeira forma de Estado se submete à autoridade civil na qual a condição de desigualdade se justifica pelo domínio de uma parte sobre outra, isto é, indivíduos que gozam de direitos privados e públicos e indivíduos sem situação jurídica definida. A passagem da república aristocrática para a popular ocorre pela revolta dos que estão sujeitos àqueles que detêm o poder e os direitos. O fim da república popular leva ao principado ou monarquia, pela degeneração da liberdade e do antagonismo das facções, enfim, o principado surge como forma de proteger o povo de si mesmo. É o governo popular levado à perfeição.

Vico refere-se à divisão da história em três momentos: era dos deuses, dos heróis, dos homens. A era dos homens corresponde a fase das famílias (surgimento do sentido religioso, despertar do sono da animalidade). A era dos heróis corresponde a fase das repúblicas aristocráticas (dominadas por homens fortes, rudes e violentos). A era dos homens corresponde a republica popular e a monarquia.

O trabalho de Vico leva em consideração o curso histórico e a causa de suas mudanças, por isso se distingue das filosofias antigas por ser progressiva. Ao contrário de Platão, Políbio, Aristóteles e Maquiavel, cada um com suas particularidades. Em Vico a realidade é contrária, o desenvolvimento de se dá da fase bestial a melhor forma de governo. Sua teoria inscreve-se perfeitamente na história das teorias do progresso. Porém, o que ocorre quando o curso proposto por Vico se esgota? Nas palavras de Norberto Bobbio, “a humanidade ingressa numa fase de decadência tão grave que precisa recomeçar um novo ciclo”. Para isso, Vico toma a Idade Medieval como o retorno à fase bestial. Mesmo assim, permanece de pé o problema das caudas que levam ás mudanças na história, seu curso e ricorso. Em Vico permanece a idéia de que os antagonismos são fatores construtivos para o desenvolvimento histórico, essencial para o avanço da sociedade, idéia já exposta por Maquiavel.

O capítulo X trata de Montesquieu, e a análise da obra “O Espírito das Leis”. Montesquieu propõe o problema de saber se há leis gerais que presidem à formação e ao desenvolvimento da sociedade humana. Vico trabalhara com a dimensão temporal, mas Montesquieu amplia sua analise, sobretudo a dimensão espacial e geográfica. O principal interesse de Montesquieu é a descoberta das leis que governam o movimento e as formas da sociedade, por isso Norberto Bobbio, o define como o teórico da sociedade. Para o Montesquieu o mundo é governado por leis, e não por cega fatalidade. Para assegurar respeito às leis naturais os homens criaram novas leis, leis positivas para forçar a coesão do grupo. O mundo natural é governado por leis naturais, por isso é mais fácil compreende-las, já o mundo humano, mais complexo, necessita de leis positivas variadas como modo de organização social particular, divergente de povo para povo.

Montesquieu distingue três espécies de leis positivas. 1) leis que regulam as relações entre grupos independentes (Estado para Estado) – corresponde ao direito das gentes, hoje, direito internacional. 2) as que regulam a relação entre governantes e governados – direito político, hoje, direito público. 3) e as que regulam a relação entre governados entre si – direito civil. Montesquieu sempre remete a idéia de um estudo criterioso das leis positivas, porque a partir delas pode-se construir uma teoria geral da sociedade. A multiplicidade das leis revela a complexidade das sociedades, por isso Bobbio acrescenta que é preciso métodos de estudo rigorosos e o mesmo espírito de observação. A causa de tal variação na construção das leis positiva pode ser discutida sob três aspectos: físicas ou naturais (clima, fertilidade do solo); econômico sociais (modo de subsistência); espirituais (religião).

As categorias que permitem ordenar as formas históricas da sociedade estão relacionadas diretamente com as formas políticas assumidas elas. Montesquieu rompe com a tripartição baseada no questionamento “quem” e “como” governa, e na bipartição de Maquiavel. Permanece a tripartição, mas com a mistura de critérios anteriores. Montesquieu adota a bipartição de Maquiavel (monarquia e república), porém acrescenta o despotismo como uma forma de governo autônomo, separado da monarquia (diferentes de Bodin que coloca o despotismo como uma categoria da monarquia). Os sujeitos do poder soberano permitem distinguir a monarquia da república, e o modo de governar distingue monarquia de despotismo. Agora o mundo extra-europeu, ou seja, o oriental, passa a ser estuda de maneira mais profunda por Montesquieu. Bobbio diz que “a tipologia de Montesquieu se torna mais clara se a interpretarmos como reiteração da classificação tradicional” que adicional o mundo asiático tomado como uma forma independente.

Outra novidade de Montesquieu é a tipologia que se baseia em dois planos: o da natureza dos governos e o dos princípios que o orientam. A natureza de um governo, para Montesquieu, derivada de sua estrutura, da constituição que a regula. Mas também é derivado da “paixão” fundamental (o princípio) que induz aos súditos agir em conformidade com as leis positivas estabelecidas. Então quais os princípios presentes nas formas de governo de Montesquieu? 1) a virtude cívica – república; a honra – monarquia; o medo – despotismo. A “virtude” de Montesquieu não está ligada somente à atitude moral, mas é a atitude que vincula intimamente o indivíduo a tudo que participa, numa palavra, o “amor à pátria”. Nas palavras de Montesquieu: “o amor da pátria leva aos bons costumes, e estes ao amor da pátria”. Outro trecho: “o que chamo de virtude, não é senão o amor da pátria, isto é, da igualdade”. Norberto Bobbio acrescenta o sentido de igualdade que aparece em Montesquieu: “é um conceito importante, que condiciona o exercício da virtude enquanto amor da pátria. Ama-se a pátria como algo que é de todos: ela é percebida como pertencente a todos, que consideram iguais entre si”.

A “honra” em Montesquieu é considerada o sentimento que nos leva a executar uma ação pelo desejo de manter ou ter uma boa reputação. A “virtude” republicana visa o bem comum, já a “honra” é uma mola individual que serve ao bem comum porque leva ao cumprimento do dever. A “virtude” republicana pressupõe uma sociedade de iguais, ao contrário da “honra” republicana. Já o “medo” é a categoria que caracteriza o despotismo.

Para Montesquieu a monarquia se distingue de forma mais intensa do despotismo que a república, porque o monarca tem seu poder controlado por corpos intermediários, uma faixa de poderes entre os súditos e o soberano, que impedem o abuso do monarca: “contra-poderes”.

Montesquieu introduz uma nova tipologia: a do governo moderado. A principal característica de um governo moderado é a distribuição do poder de tal modo que, havendo poderes contrapostos, nenhum se sobrepõe aos demais de forma arbitrária. Ao lado da divisão horizontal, figura a divisão vertical: célebre teoria da separação dos poderes. Tanto o governo misto como o moderado, de Montesquieu, derivam da convicção de que o abuso do poder deve estar de forma equilibrada entre os diversos poderes parciais, com uma consideração. Há uma diferença no modo como é concebida a distribuição do poder No governo misto está relacionada com a divisão do poder entre as partes componentes da sociedade, no governo moderado de Montesquieu deriva da dissociação do poder soberano e de sua partição entre as três funções constitutivas do Estado: função legislativa, executiva e judiciária. Só interessa a Montesquieu a divisão no que diz respeito às funções do Estado e não em relação às suas partes constitutivas. Tal tipologia baseia-se na afirmação: “o poder é um freio para o poder”. E ainda justifica: “Os príncipes que quiseram transformar-se em tiranos começaram sempre reunindo na sua pessoa todas as funções públicas”. Assim, embora confirmando a tripartição política em monarquia, república e despotismo, com o uso descritivo e histórico, utiliza-se do prescritivo ou axiológico. Deste deriva a divisão em governos moderados e despóticos (imoderados).

O capítulo XI, denominado “Intervalo: Despotismo”, Norberto Bobbio analisa as considerações de Montesquieu e de outros autores a respeito do despotismo. O que diferencia a denominação de despotismo de Montesquieu, principalmente de Aristóteles, diz respeito à “distribuição dos poderes” que existe nas monarquias, em oposição ao despotismo. A autonomia do despotismo assumido em Montesquieu pode ser evidenciada pelos vários ângulos que tal tipologia é estudada: natural, econômico, jurídico, social, religioso, enquanto nos outros autores o critério básico é o político, no qual a escravidão é apenas um de seus elementos. Outros fatores são o clima, extensão territorial, caráter dos habitantes, tipos de leis, religião. Nicolas Antoine Boulanger propõe uma interpretação religiosa, ou melhor, teocrática do despotismo. No qual diz que a os males da sociedade situa-se no governo da religião, teocracia, que produziu no oriente o despotismo. Outro autor, Wittfogel revela que os poderosos aparelhos burocráticos que caracterizam o governo despótico oriental surgem como necessidade de regulamentar a irrigação. Para tal autor, o governo despótico caracteriza-se pelo monopólio da organização burocrática, que é hoje aplicado às sociedades industrializadas.

No Capítulo XII será tratada a importância de Hegel para o pensamento político das teorias das formas de governo. Em Hegel, encontra-se uma concepção histórica das formas de governo, presente também em Vico, e uma concepção espacial e geográfica, presente em Montesquieu. A influencia de Montesquieu não pode ser simplificada somente ao nível espacial ou geográfico do desenvolvimento da história, ela toma uma caráter mais amplo de significados. Na obra “Lições de Filosofia da História” Hegel explica que a história do mundo passou três fases caracterizadas por três tipos diversos de base geográfica: “o altiplano” característico das sociedades nômades da Ásia Central; “planície fluvial” característica das sociedades onde a agricultura é a base econômica, Índia, Nilo, Ganges, Tigre, Eufrates, Nilo; “zona costeira” característica de sociedades comerciais. Assim, as atividades pastoris, agrícolas e comerciais, correspondem a três fases do desenvolvimento das sociedades humanas. Porém, a evolução das sociedades não ocorre apenas em momentos sucessivos do tempo e do espaço, mas segundo Hegel, mediante um deslocamento de região para região. Com este pensamento, Hegel deposita na América (“país do futuro”) um sentimento de prosperidade no curso da história universal.

Quanto á tipologia das formas de governo, é interessante perceber a influencia de Montesquieu em Hegel, que toma as formas de governo de forma idêntica (despotismo – Oriente; república – antiga; monarquia – moderna). É importante lembrar que o conceito de constituição para Hegel é definido como “a porta por onde o momento abstrato do Estado penetra na vida e na realidade”, ou seja, é o momento em que o Estado assume seu caráter concreto e histórico. A passagem do homem “da fase desenfreada da vontade natural à universal e à liberdade subjetiva” é um dos pontos que distinguem para Hegel cada forma de governo. “O Oriente sabia e sabe que um só pode ser livre, o mundo grego e romano, que alguns são livres, o mundo germânico, que todos são livres”. Assim, segue a sucessão: despotismo, república (aristocrática e popular) e monarquia. Norberto Bobbio acrescenta quanto à Hegel: “Não só a tipologia hegeliana não difere da de Montesquieu, mas é adotada como esquema geral do processo histórico de modo bem mais exemplar e rígido …”. As formas históricas de constituição intrínsecas ao Estado passam por três etapas: uma espécie de reino patriarcal que corresponde ao despotismo, uma forma de Estado livre, de liberdade particularíssima que é a república, no seu sentido total, e uma forma de sociedade articulada em esferas relativamente autônomas que corresponde á monarquia. Tal análise não faz uso de um critério simples cuja referencia é apenas “quem” governa e “como” governa, e sim, leva em consideração a estrutura da sociedade no seu conjunto.

Na forma patriarcal, as esferas que compõem a sociedade encontram-se ainda indiferenciadas e inarticuladas, “não emergiram da indistinta unidade social, afirma Bobbio”, como a família. Na segunda forma, começam a emergir esferas particulares, mas não chegam a ser completamente autônomas com relação à totalidade. Na terceira forma, a unidade é perfeitamente compatível com a liberdade das partes, ou seja, a unidade se recompõe mediante a articulação das suas diferentes partes, momento em que a monarquia diferencia-se da tradicional, com a denominação de monarquia “constitucional”.

Entende-se a estrutura do governo como a única manifestação do espírito do povo, que precisa ser único para realmente expressar o espírito desse povo. Assim, não há constituição perfeita aplicável a povos diversos. Por isso, Hegel considera absurdo discutir a melhor forma de governo, porque serio o mesmo que perguntar “quem deveria fazer o espírito de um povo”.

Norberto Bobbio nos coloca uma dúvida a respeito de Hegel, quando divide em quatro as diversas fases da história universal: o mundo oriental, o mundo helênico, o mundo romano, o mundo germânico. Tal divisão da história universal tem como novidade ”o mundo romano” de forma particular em relação aos outros momentos. Para esclarecer Bobbio acrescenta que Hegel “interpreta esse período como uma grande era de transição entre o fim do mundo antigo e o início do moderno. Enquanto transição, a época imperial não corresponde a nenhuma das três formas históricas, porque não é propriamente uma forma de Estado”. Hegel: a) enfatiza que o império romano abrange uma variedade de povos, e, portanto não possui o elemento que caracteriza o Estado, o elemento popular (nacional). È para Hegel uma “universalidade abstrata”.b) a cidadania indistinta a todos os súditos transforma todos em pessoas formalmente iguais, ligadas somente por relações de direito privado, e quando existem apenas relações de direito privado não há ainda um Estado. Nas apalavras de Bobbio, “tanto o universalismo abstrato como o particularismo individualista são características que contrastam coma realidade concreta e histórica de um Estado”. Passado o período de transição a história retoma o seu caráter ternário.

Quanto ao mundo Oriental, chamado de a idade do despotismo, podemos distinguir três formas, deslocando-se do oriente ao ocidente: o despotismo teocrático (China); a aristocracia teocrática (Índia); monarquia teocrática (Pérsia). Como se vê o caráter determinante que distingue um regime despótico do outro é a teocracia. Hegel define o despotismo como a “era infantil da história”, ou seja, é nela que o homem ingressa pela primeira vez no curso histórico. Contudo não apresenta um desenvolvimento perfeito da história, “história a-histórica”, “história sem história”, porque mesmo com todas as mutações “não produzem qualquer progresso”. A história histórica só tem começo no Ocidente.

Não obstante, se há um período no qual o homem ingressa na etapa histórica, há um período anterior no qual o homem ainda não alcançou tal “progresso”. Este homem corresponde, em Hegel, ao homem africano (ele não tem propriamente um história) considerado o “homem no estado bruto”, o homem natural na sua total barbárie e ausência de freios”. Até em Montesquieu encontra-se uma passagem que refere-se ao negro, algo que talvez Hegel tomou como exemplo:

“Não podemos nos convencer de que Deus, um ser de grande sabedoria, pôs uma alma, e, sobretudo uma boa alma, num corpo tão negro… É impossível supormos que se trate de homens porque se admitirmos isso, poderíamos começar a crer que nós próprios não somos cristãos”. (Monstesquieu, O Espírito das Leis).

Hegel não admite utilizar o uso prescritivo, porque sua intenção não é a do melhor governo, e sim, entender, talvez, “a razão do Estado”, da história, da sociedade. Embora não o faça diretamente, Hegel expõe uma preferência pela monarquia constitucional, mas não a define como a melhor, e sim, aquele que detém, o “espírito do povo”.

<!–[if !supportFootnotes]–>

<!–[endif]–>

<!–[if !supportFootnotes]–>[1]<!–[endif]–> Norberto Bobbio fala de Estado, mas sua terminologia ainda não era empregada no seu sentido moderno.

<!–[if !supportFootnotes]–>[2]<!–[endif]–> Vale lembrar que o termo “Estado”, no seu sentido moderno, aparece pela primeira vez com Maquiavel.

comentários
  1. maicon disse:

    Esse site é um lixo ta uma bosta

    • Magnólia Fernandes disse:

      Obrigado por divulgar esse texto que está bem redigido e com uma objetividade que ajuda aos iniciantes a entender a ciência politica.

  2. Djow disse:

    ta agora eu queria o capitulo XIV i tu não boto??

  3. hello disse:

    Não sei o que leva alguem a colocar comentários como os acima! Nâo faz nada e ainda diminui o trabalho dos outros! Rídiculo…

  4. eduardo fredo disse:

    valeu Jackson, tá uma excelente resenha que serve de aproveitamento pra quem realmente estuda e precisa das informações,

    abraço e continue explorando temas da ciencia política e teoria do Estado

  5. Ana Carolina Duarte disse:

    Oi! Vou ler a sua resenha para o concurso que vou fazer!!!!
    Muito Obrigada!

  6. Guilherme Nogueira de Souza disse:

    Muitíssimo obrigado… Esta resenha salvou o meu dia!!!

  7. Diana disse:

    Muito bom!!Vai me ajudar muito em minha pesquisa acadêmica.
    Abç,

  8. Marina Naves disse:

    muito obrigada agora vou tirar 10 em sociologia, estava precisando mesmo ((:

  9. jkviana disse:

    Pessoal que bom que esse Resumo esta ajudando algumas pessoas.
    Boa sorte a todos nas provas e nos concursos .. ehhe

  10. Valdemir disse:

    qual a critica que maquiavel faz as formas de governo proposta por Platão ?

  11. jkviana disse:

    Cara .. eu sou um simples estudante universitário da UFPI. Mas a resposta que procura está na resenha não de forma direta, mas se encontra acima.

  12. Mel disse:

    Muito obrigada pela disponibilização. Excelente.

  13. Eduardo Almeida disse:

    Parabens pela sua explanação acerca das teorias politicas. enriqueceu minhas idéias..Obrigado

  14. Gabriela disse:

    Adoreiii salvou meu trab.

  15. juliano disse:

    horriiivel fiii se estudou onde?? eco cara,vaii ir jogar teniss ..peteca..voce e sua filosofia é uma BOSTA!!! nem achei o q eu queriia VAII SE FUDERR!!

  16. jkviana disse:

    Vlws pelos elogios e pelas criticas …
    Minha intenção nunca foi dá uma de filósofo, até pq eu não sou !!! Eu simplesmente li o livro e resolvi fazer uma resenha do livro para uma prova !!! Enfim, faz quatro anos ,,,, mas de alguma forma acho que ajudou algumas pessoas !!! Isso é o que importa …
    AGORA SE VOCÊ NÃO ACHOU O QUE QUERIA SESSA RESENHA É SIMPLES: Abra o livro vá lê-lo !!!

  17. renan cruzeiro disse:

    valeu agora tiro 10!

  18. Lis disse:

    PERFEITO, me ajudou muito… ler o livro e ter sua resenha, foi uma luz a mais.

  19. Fernanda disse:

    Muito boa sua resenha, deu uma visão mais ampla nos aspectos que eu procurava.

  20. Elisa disse:

    Muito bom mesmo. Ajuda muito quem esta no início dos estudos de ciências políticas.

  21. ale disse:

    cap. 11 ta fraco hein :s

  22. João Ribeiro disse:

    Ótima resenha,

    me ajudou muito a entender um livro tão complicado.

  23. Renata disse:

    parabéns!A sua iniciativa só agrega!

  24. Adriana disse:

    Show de bola !
    Parabéns pela boa vontade.
    Ajudou muito na compreensão. ;*

  25. Leticia disse:

    Obrigada

  26. Idila disse:

    Parabéns pelo trabalho realizado.

  27. GABI disse:

    oi, muito boa, ajudou muito a entender o livro de Bobbio.

  28. Joice franco disse:

    AMAZING!! A leitura dos capítulos do livro seguida pela resenha está me dando uma base ideal para minha prova de ciência politica. Parabéns Jackson, tenho certeza que ajuda muita gente!!
    Beijos sabor gratidão.

  29. Camila disse:

    vai me helpar bastante na prova de Ciência Política sobre o livro, valeu!

  30. Djow - Zica disse:

    QUE LIXO DE RESENHA, APRENDE ESCREVER CARA

  31. Denise Ferreira disse:

    parabéns vc é o cara

  32. JAYSON RIBEIRO SILVA disse:

    Muito obrigado pelo texto meu amigo…continua postando…

Deixar mensagem para Djow Cancelar resposta